Disco Nota 11: “Krig-ha, bandolo!” – Raul Seixas

José Maurício

 

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O quarto LP de Raul Seixas, “Krig-Ha, Bandolo!” – nome tirado do grito de Tarzan, das histórias em quadrinhos – foi lançado em junho de 1973. Antes dele – que é de fato o primeiro álbum “prá valer” de Raul – tivemos “Raulzito e os Panteras” (1968), “Sociedade da Grã-Ordem Kavernista Apresenta: Sessão das 10” (1971) e “Os 24 Maiores Sucessos da Era do Rock” (1973). Este último creditado a um conjunto Rock Generation, mas relançado em 1975 (depois do sucesso de “Krig-Ha” e “Gita”) como “20 Anos de Rock” (o meu eu ganhei do Paulo) com Raul Seixas na capa (nome, foto e desenho). Em 1985 voltou a ser reeditado, agora como “30 Anos de Rock”.

Tarzab nos quadrinhos

Tarzab nos quadrinhos

A primeira faixa do disco é uma gravação caseira de Raul aos nove anos “cantando” Good Rockin’ Tonight (Roy Brown) creditada como “Introdução” para Mosca na Sopa, uma mistura de roda de capoeira – com direito a berimbau e vocal das “meninas do terreiro”, conforme encarte feito por Adalgisa Rios, então mulher de Paulo Coelho – e rock, seguindo o modelo que já tinha obtido sucesso em Let Me Sing (neste caso, baião e rock). Já estava anunciada a primeira face de Raul Seixas: a mosca perturbadora.

Outras faces viriam até o maluco beleza se revelar. Logo na segunda música, um clássico: Metamorfose Ambulante (mais uma face) um sucesso que permanece até hoje e já foi regravada por Ney Matogrosso, Detonautas, Raimundos, Zé Ramalho, dentre outros. Um hino à liberdade de pensamento e à necessidade constante de reconsideramos nossas opiniões e conceitos.

Wood e Stock - tira de Angeli - filosofam sobre Raul Seixas

Wood e Stock – tira de Angeli – filosofam sobre Raul Seixas

Em Dentadura Postiça, o violão com cordas de aço de Raul faz a base para os altos e baixos da vida, desfilando o que cai, o que sai e o que sobe. As Minas do Rei Salomão e A Hora do Trem Passar marcam as primeiras parcerias com Paulo Coelho apresentadas no disco. O lado B começa com Al Capone, um rock que mistura Jimi Hendrix, Frank Sinatra, Júlio César, Al Capone e Jesus Cristo.

How Could  I Know, a segunda do lado B, possui duas letras, essa do “Krig-Ha” (filosófica) e outra romântica (uma demo com acompanhamento de piano) lançada no album “Baú do Raul” com o título de How Could I Know (Love Was to Go) feita segundo a lenda para que Elvis Presley gravasse, mas a fita chegou tarde ao seu destino. Rockixe começa com um riff do baixo de Paulo Cezar Barros, do Renato e seus Blue Caps, que aliás toca em todas as faixas desse disco exceto n”A Hora do Trem Passar”.

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Em Cachorro Urubu a resposta de Raul ao “the dream is over” de Lennon: “…todo jornal que eu leio me diz que a gente já era, que já não é mais primavera. Ô baby, a gente ainda nem começou…” e era apenas o começo.

Para fechar o lado B, Ouro de Tolo, o primeiro  sucesso do disco, lançado antes em compacto simples (maio/73). Uma crítica à sociedade consumista e, de certa forma, uma profecia sobre sua morte “…Eu que não me sento no trono de um apartamento com a boca escancarada, cheia de dentes, esperando a morte chegar…”. Em uma das edições (mais rara) desse compacto Raul troca “Corcel 73” por “carrão 73”. No LP, exite ainda, mais uma faixa (uma vinheta onde Raul declama em meio a variação de rotação “Meu nome é Raul Santos Seixas, eu sou baiano de Quenguenheim (?) oito horas de mula e doze de trem. Que o mel é doce é coisa de que me nego a afirmar, mas que parece doce eu afirmo plenamente… …Deus é aquilo que me falta para compreeder o que não compreendo…” Esta vinheta ficou fora da edição em CD (pelo menos do meu CD).

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Talvez o segredo do sucesso de Raulzito seja a mistura dos problemas: como na música Eu Também Vou Reclamar onde a verdade do Universo e a prestação que vai vencer são os problemas que afligem nosso heroi (quem mais pensaria nisso?). Raul também tem outra virtude: agradar diferentes públicos. Conheço quem gosta de Iron Maden e Raul Seixas, Jerry Adriani e Raul Seixas, Beatles e Raul Seixas, até sertanejos gostam e gravam Raulzito. Isso pode ser explicado pela fase de produtor que ele passou na CBS compondo e produzindo grandes sucessos (Doce Doce Amor, Ainda Queima a Esperança, Lágrima nos Olhos, etc). Meu pai, além de Capricho Italiano, de Tchaikovsky (considerada por ele “a música mais bonita do mundo”) gostava também de boleros e entre eles Sessão das 10.

Raul e Paulo Coelho

Raul e Paulo Coelho

Já ouvi dizer que o sucesso de Raul se deve ao seu parceiro Paulo Coelho. Eu – como fã de carteirinha (literalmente: Raul Rock Club 09.451/89 de 14 de setembro de 1989) – sempre achei o oposto. Recentemente descobri que Paulo Coelho pensa como eu. Veja o depoimento de Don Paulete no primeiro minuto do documentário “Por Toda Minha Vida”, da Rede Globo em 2009 http://www.youtube.com/watch?NR=1&feature=endscreen&v=MigUEMFJGoo. As músicas principais de “Krig-Ha”, Mosca na Sopa, Metamorfose Ambulante e Ouro de Tolo, são apenas de Raul enquanto Maluco Beleza (talvez seu maior sucesso) tem como parceiro, Cláudio Roberto.

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FAIXAS

Lado A

1) Introdução: Good Rockin’ Tonight (Roy Brown)
2) Mosca na Sopa (Raul Seixas)
3) Metamorfose Ambulante (Raul Seixas)
4) Dentadura Postiça (Raul Seixas)
5) As Minas do Rei Salomão (Raul Seixas, Paulo Coelho)
6) A Hora do Trem Passar (Raul Seixas, Paulo Coelho)

Lado B

1) Al Capone (Raul Seixas, Paulo Coelho)
2) How Could I Know (Raul Seixas)
3) Rockixe (Raul Seixas, Paulo Coelho)
4) Cachorro Urubu (Raul Seixas, Paulo Coelho)
5) Ouro de Tolo (Raul Seixas)

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CURIOSIDADES

Paulo Coelho foi parceiro de Rita Lee em Esse Tal de Roque Enrow e de Fábio Jr em oito das doze músicas no seu primeiro disco (“Fábio Júnior” de 1976).

Existe uma discoteca em Buenos Aires, dedicada à difusão da música e cultura do Brasil, chamada Maluco Beleza (http://www.malucobeleza.com.ar)

"Cara de Capa" com o disco

“Cara de Capa” com o disco

O disco “Krig-Ha Bandolo!” foi o primeiro “cara de capa de disco” que fiz, usando “meu amigo (filho) Pedro” como modelo, ao acordar, ainda de pijamas. O resultado pode ser visto em  http://www.sleeveface.com/?cat=598

Raul Seixas já foi confundido com um impostor em Caieiras (interior de São Paulo) num show em 16/05/82, sendo preso e espancado. Detalhes deste episódio no curta metragem “Tanta Estrela por Aí” estrelado por … Rita Lee, no papel do maluco beleza.

Parte1: http://www.youtube.com/watch?v=nt4ObBquF_o

Parte 2: http://www.youtube.com/watch?v=sK-nuP1ouWI

Raul Seixas contou que rascunhou a letra de Metamorfose Ambulante na parede de seu quarto, quando era adolescente.

Encarte do álbum

Encarte do álbum

Quando eu fazia economia, uma colega de classe me pediu para “fazer” uma fita com músicas de Chico Buarque e Caetano Veloso para um estudante americano que estava fazendo intercâmbio no Brasil, com o intuito de mostrar nossa música. Montei a fita conforme solicitado acrescentando How Could I Know e Metamorfose Ambulante, uma em cada lado da fita. Em uma semana recebi outro pedido (acompanhado de oito fitas K7 TDK) para gravar tudo que tivesse daquele cara que “cantava em inglês e português”…

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MÚSICAS

 

Ouça o álbum completo:

2 comentários sobre “Disco Nota 11: “Krig-ha, bandolo!” – Raul Seixas

  1. Raul Seixas é tão unânime que numa máquina de videokê comum que tem num bar aqui em porto alegre tem umas doze músicas dele. Só tem menos faixas na máquina que o Roberto Carlos . Foi um músico que sempre prezou pela simplicidade de sua música em oposto à superioridade da mensagem. Talvez por ser um roqueiro de raíz, mas acho que ele sabia muito bem o que estava fazendo ,não se deixando influenciar pelo rock progressivo que era corrente até aqui no Brasil (os mutantes já não tinham mais Arnaldo e Rita em 1973 e Sérgio Dias transformou o grupo em algo totalmente prog, por exemplo) deixando então sua obra pra todas as audiências. Fez a música mais dinâmica do rock nacional de sua geração, simplificando as melodias de uma forma que até pra ele servia nos shows e a todos em qualquer roda num parque com um violão, até hoje , com suas letras fáceis de cantar mas de difícil compreensão , pela quantidade de temas mostrados . É um dos motivos de sua obra ser considerada imortal quase trinta anos após sua morte. Ele é mais bardo que virtuose. Um comunicador excepcional .

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